segunda-feira, 29 de julho de 2019

Prisão de hackers pressiona Lava Jato e testa autonomia da PF e relação com Moro


Pergunta de delegado em depoimento indica não haver preocupação em agradar ao ministro
Inicialmente comemorada pelo ministro Sergio Moro (Justiça), a operação que prendeu o grupo de hackers na semana passada coloca mais pressão na Lava Jato, avaliam investigadores. O caso vai testar, novamente, a autonomia da Polícia Federal. O material apreendido no computador de um dos presos, Walter Delgatti Neto, pode ser usado, no futuro, em processos da Lava Jato ou em casos de investigação contra autoridades, envolvendo entre elas Moro, hoje chefe da PF. Em menos de uma semana, a ação da polícia fez o ministro mudar de discurso em relação aos apelos que fazia por perícia nos arquivos obtidos pelo site The Intercept Brasil e provocou mal-estar interno. Reveladas desde 9 de junho em uma série de reportagens inicialmente publicadas pelo The Intercept, as mensagens constrangem os envolvidos na maior operação de combate à corrupção da história do país, com bastidores que mostram colaboração entre juiz e procuradores. Até agora, na avaliação de investigadores, não houve nenhuma descoberta no caso dos hackers que possa ser considerada positiva para a versão de Moro e Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. A PF investiga se houve pagamento para a compra do material, mas ainda não tem nenhum indício nesse sentido. Além disso, no primeiro depoimento do hacker, o delegado Luiz Flávio Zampronha fez pergunta sobre a edição do material e colocou em termo (ou seja, na transcrição oficial do interrogatório) a negativa de Delgatti, que disse não ter manipulado o conteúdo das mensagens. Na opinião de pessoas envolvidas no caso, essa parte da oitiva demonstra que o inquérito está sendo conduzido sem a preocupação de agradar ao ministro. Além disso, a resposta é mais um ponto considerado ruim para Moro e Deltan, que vinham se apoiando na defesa de que não podem confirmar a veracidade das conversas. Até o dia da operação, o ministro da Justiça vinha cobrando o jornalista Glenn Greenwald, fundador do Intercept, para que entregasse os arquivos para serem periciados. Após saber que o material havia sido apreendido, Moro mudou o tom. Ligou para autoridades vítimas para avisar que o conteúdo seria destruído. A assessoria do ministro confirmou que ele havia dado esse recado nos telefonemas. A PF teve que se movimentar e, em minutos, publicou uma nota oficial sobre o tema, rechaçando a possibilidade da destruição e esclarecendo o que a lei estabelece: apenas o juiz do caso pode decidir sobre o destino do material. A Folha questionou o ministro de Jair Bolsonaro (PSL) sobre sua mudança de discurso em relação à perícia, mas não houve resposta. Embora a PF considere que Delgatti tem ajudado na investigação, suas respostas são vistas com reserva, por seu passado criminal, com condenação e acusações de golpes e fraudes. Ele tem sido chamado internamente de “contador de histórias”, característica considerada típica de estelionatários.
Folha de S. Paulo

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